No mês de junho, o Cineclube Gengibirra exibiu o filme mais recente do diretor Spike Lee: Infiltrado na Klan. No momento em que o filme acabou, houve uma espécie de minuto de silêncio não combinado. Ninguém conseguia falar nada. Foi difícil iniciar o debate, tamanho tapa na cara (tamanha voadora na cara!).
Muitos dos leitores já devem saber do que o filme trata: a história real, baseada em um livro, de um policial negro que, de maneira surreal, consegue se infiltrar em uma das organizações mais nojentas que a humanidade foi capaz de produzir: a Klu Klux Klan.
A história por si só já desperta o interesse, mas o filme de Lee não fica nisso. É um filme sobre IDENTIDADE (e aqui tento tomar o máximo de cuidado ao comentar a realidade de identidades que não são a minha): a identidade do policial negro que tem que ouvir absurdos imensos de seus colegas e que tem que ralar muito mais que os policiais brancos para mostrar seu valor (poxa, o cara conseguiu se infiltrar na KKK e, até pouco tempo atrás, ninguém sabia dessa história!); a identidade do judeu que, mesmo não seguindo as tradições de sua família, passa a se importar e entender suas origens quando tem de negar quem ele é; a identidade de todo o movimento negro nos Estados Unidos, e de como é importante para essa galera ter orgulho de sua negritude, e aí destaco os takes lindíssimos que Lee usa para celebrar o negro.
É um filme também sobre ABSURDOS: o absurdo de existir um grupo de pessoas que se julga superior às outras pela cor da pele. O absurdo que é o fato desse grupo NUNCA ter deixado de existir, ainda hoje se manifesta quando surgem as oportunidades de ser babacas. O absurdo que é o fato de ideias como as da organização permearem a cabeça de pessoas pelo mundo todo. E por fim, o absurdo que é o fato de que pessoas com esses ideais têm sido ELEITAS para os mais diversos cargos públicos, ou seja, muita gente compartilha dessas ideias e isso é MUITO, MUITO ABSURDO.
Infiltrado na Klan é REVOLUCIONÁRIO! Não à toa não ganhou o Oscar de melhor filme, uma injustiça sem tamanho. Mas já viu, né, a Academia não é preconceituosa, ela até indica filmes de diretores negros!
Em um trecho da autobiografia do Luis Buñuel, aquele cineasta espanhol amigo do Salvador Dalí, ele comenta sobre a primeira vez que viu O Encouraçado Potemkin, do russo Sergei Einsenstein. Diz ele que a galera ficou tão atiçada na plateia que estavam prontos para sair do cinema e erguer barricadas.
Foi assim que me senti quando vi Infiltrado na Klan, e acho que é esse o tipo de arte que precisamos no momento. Uma arte que nos revolte, que nos indigne, que nos esfregue as verdades na cara. Concordo também com o alemão Friedrich Nieztsche, que temos a arte para não morrer da verdade, afinal, o que seria da nossa vidinha medíocre sem a arte né? Duvido que você passe uma semana sem ouvir uma musiquinha, ver sua série, etc.
Mas acho que o momento pede uma arte que nos tire da nossa zona de conforto, principalmente visto que surgem amebas que têm a pachorra de querer unir artistas “alinhados com os valores conservadores na arte”. E eu me pergunto o que esses artistas conservadores fariam… Sei lá, um remake de O Nascimento de uma Nação (muito bem usado no filme do Lee, como exemplo de desserviço à sociedade, inclusive)? Pois é, mas até isso já rolou, então não sei muito o que esperar… A continuação do filme do Edir Macedo? Ih, já estão fazendo também… Bom, talvez seja daí que venha a tal série sobre o presidente da república. Melhor não continuar dando ideia…
Texto por: Michele Cas.
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